Um conto.

domingo, 18 de maio de 2008

Se um dia Deus foi injusto, esse dia foi na morte de Joãozinho. Naquele dia, o mundo podia ter raiva de Deus, que não ia ser heresia. Naquele dia Deus foi capacho, foi pau-mandado do Diabo. Levou com ele a graça dos dias mórbidos e entediantes da rua 43.

Não se avexe não, que a história da morte de Joãozinho merece até um pedaço de bolo com cafezinho e um lenço no final para depositar as lágrimas. Aqui na cidadezinha não há quem não saiba da sacanagem que Deus fez. Deus tirou da terra um pedacinho de gente que não fazia nada alem de querer bem a vida.

Pois bem. Agora deixemos de prosa que o meu negócio com as palavras não é lá muito o que se orgulhar. Posso até saber contar história, mas escrever é coisa de doutor.

Joãozinho nasceu no dia 10 de fevereiro de 1998. Coisa linda o menino. Muito cheio de saúde, com 3 meses de idade a mãe já nun podia mais com o menino de tão farto que estava! Era muito risonho, ria mesmo, ria de dá gosto. Só o riso dele já era motivo de gargalhada na boca e olhos brilhantes de felicidade. E quando ele começou a falar então? Oxente, era coisa de arrepiar o coração! Era Joãozinho pra cá, Joãozinho pra lá. Quando aprendeu a escrever foi uma alegria só. Aqui não tem muita gente que saiba juntar bem as letras, mas Joãozinho era mestre nisso. O menino, com 5 anos de idade, já tinha colocado as rédeas do lápis e cavalgava numa alegria no rosto e sempre uma idéia na cabeça. Menino muito cheio das inteligências, sabia a explicação pra tudo que era coisa. Por que que o céu era azul e não rosa. Por que que os peixes não se afogavam. Era muita coisa pra um menino tão pequenininho, onde que cabia tanta letra na cabeça eu não sei, eu sei é que agente dava um numero maior que uma folha de Vitória-régia e o danado nun é que decorava? Em segundos!

Um dia Joãozinho cresceu. Já era tempo. Começou a deixar um pouco os estudos de lado para dar umas esticadas na pracinha da cidade. Eita que era muito galanteador! O cheiro dele saia grudando nas casas dos vizinhos, era mais cheiroso que feijoada saindo do forno! As meninas novinhas da idade dele eram loucas para dar um chega em Joãozinho. Famoso ele, muito famoso, tinha fama de bom na cama. Era calado o menino, pra ouvir a voz dele era um trabalho danado. Mais oia, que o bicho nun falava nada. Também, nem precisava, já falavam por ele. Era assunto dos mais comentados! Era como Joãozinho era bom na dança. Como Joãozinho era inteligente. Como Joãozinho era bom com as meninas. Era como Joãozinho era o jardin do Éden das senhoras casadas, que hà anos não batiam o ponto com o marido. Bem, se ele serviu de Éden para essas mulheres não há demônio que me faça contar. Mas o menino era matreiro viu? Era muito cheio das posturas! Falava bonito, calmo. Diferente do povo daqui. Parece até que Joãozinho tinha caído do céu de um lugar bem distante, tão distante que parecia ser de fora da terra. Só assim para explicar o chamego que fazia nos corações das mulheres. Era como feiticeiro, sem caldeirão.

Um dia, um dia só viu? Joãozinho estava chorando. Era de dar dó rapaz! O choro dele era o choro da cidade inteira! Era como se fosse o apocalipse acontecendo! Rapaz, to falando sério, não ria. Lógico que todo mundo queria saber que danado que foi que magoou Joãozinho, se nem as tapas da mãe faziam ele chorar. Não foi muito difícil não. Joãozinho era bom demais, mas era humano (para sorpresa de todos...) Joãozinho tinha uma doença no sangue. Coisa muito complicada cumpadre, nun carece de explicar não. Era tanta gente, mas, tanta gente indo ver o bichinho em casa, que parecia procissão de santo! Era tortinhas, chá, café, boas potocas de carne, vela, tudo pra agradar o doente. Mas Joãozinho não ria mais nada. Era como se tivesse perdido os músculos da cara. Nun mexia mais, se falava pouco, agora nada. Olhe, Joãozinho era tão bom, mas tão bom, que aquela doença só merecia quem tinha pecado nas costas e tinha de pagar na terra de tão ruim. Mas Joãozinho era um anjo na terra cumpadre. Era uma dor tão grande nun sentir mais aquele cheirinho bom nas ventas. Até as festas tinham acabado. A cidadezinha morria junto com ele. Morria novo, antes mesmo de ganhar a vida adulta. Era muito injusto viu? Olhe, quando alguém velho, como eu, morre, ninguém chora não. Já vivi bastante, já estou devendo na terra. Mas Joãozinho? Aquele menino ia ser doutor! Ia estudar na cidade. Tava até pensando em ir pras Europa. Ele mais a mãe dele. Filho exemplar! Chegou a ter filho não, era novinho, tadinho. A cidade inteira acendeu vela pra ele, Deus devia era de ta dormindo naquele dia! Eita raiva! E as meninas choravam. É de fazer chorar ver gente bonita e jovem morrer!

Joãozinho morreu sozinho naquele dia. Era dia de missa, ninguém falta a missa, é pecado. Ninguem queria pecar perto da morte de Joãozinho pra ver se conseguia alguma graça pra ele. Mas olhe, companheiro, não houve reza, canto, vela, escapulário, choro, oração, doação que convencesse Deus a deixar nosso menino um tantinho mais na terra. Era coisa de teimosia.

Ei, cumpadre, nem vi o sol passando! Vou mimbora antes que a mulher pense que nun volto mais. Não, não, nun carece de você levantar da sua cama não, pode ficar, eu sei o caminho de volta. Brigado pelo cafezinho viu? Tava bom que só a gota. Amanhã eu volto pra modo de eu contar mais uma história pra você. Essa de Joãozinho é muito triste, difícil de contar. Mas, fique ai com suas rezas, pra ver se consegue escapar da morte. Vamo ver se Deus te atende. Inté amanhã.

2 comentários:

Anônimo disse...

Nossa to pasmado!Eu já disse e vou repetir, eu me orgulho dessa menina!!! ;D
Flávia eu sabia que vc escrevia!mas não tão bem assim!!!
Mas uma nova escritora pernambucana!! :D
Será que Deus vai atender-nos???
Beijos!

Unknown disse...

Nossa Faço Das Palavras Do CÁSSIO Ás Minhas!
Muito boa Vc Em Escritora Viu Parabéns!Será Que Teremos Mesmo Uma Nova Escritora?!
HaHaHa!!
Adorei Vice..Beijos!
=**