Codinome Orquídea - Parte 6

sábado, 7 de junho de 2008


Antes de ir se encontrar com Patrícia, Lucas foi encontrar-se com seus amigos de colégio. Todos eles estavam escondidos no mesmo local de todas as reuniões. A casa da praia.

- Jorge? Está ai? – Perguntou Lucas ao entrar.
- Estamos todos aqui.
- Muito obrigado por terem vindo, de verdade. – Sentou-se junto aos amigos, que estavam no sofá.
- Claro. Nunca deixamos um amigo na mão.
- Bem, é o seguinte. O protesto será amanhã às dezoito horas. E todos vocês sabem do meu envolvimento com a Patrícia. Ela já foi pega duas vezes. Uma pelos soldados no dia da ronda. E outra pelo meu pai, quando foi vista saindo da minha casa. Não posso permitir que isso aconteça com ela novamente. Por isso, no dia do protesto, quero que, quando estejamos todos juntos, vocês levem Patrícia para longe do Ministério. Se alguém tem de ser pego, esse alguém, sou eu. Tenho mais chances de escapar. Levem-na á casa do diretor, ele está nos apoiando. Tudo bem?
- Claro amigo. – Respondeu Jorge pelos outros.
- Muito obrigado.

Lucas partiu da Casa da Praia e foi até o encontro com Patrícia. O caminho estava escuro, não havia mais ninguém na rua, além dos soldados que faziam a ronda como sempre. Teve de andar por entre as árvores para que não fosse visto.

- Lucas! – Agarrou-o e deu-lhe um beijo molhado.
- Como estou feliz em te ver. Em te beijar... – Beijaram-se novamente.
- Vem, entra. Tenho algo para te contar. – Entraram no colégio que estava deserto e escuro.
- O que?
- Quero transar com você. Agora. Amanhã talvez já não possa mais.

Lucas a guiou por entre os móveis da sala de aula mais próxima e acabaram deitando-se sobre o chão, agora sem medo.
A beijava com calor, com vontade. Tirou a presilha que prendia o cabelo de Patrícia revelando longos cabelos negros que caiam sobre seus ombros que agora ele os beijava, descendo até seus seios. Patrícia agora vestia uma saia branca de tecido fino e uma blusa básica preta colada ao corpo que ele estava tirando, mostrando para ele aquele lindo corpo que lhe fazia excitar-se apenas em imaginar.
Patrícia o olhava com brilho nos olhos, também estava excitada demais para falar algo. Ela tirava a roupa de Lucas que se deixava levar pela delicadeza dos seus dedos, antes de tirar a bermuda, conduziu a mão dela para dentro dele fazendo ela massagear seu membro, Lucas estava louco de prazer. E finalmente os dois nus. Abraçados num ambiente escuro, seus corpos quentes e arrepiados de prazer se tocando, longos e molhados beijos completavam o fim daquele sexo.

- Eu estou com medo Lucas. Muito...
- Eu também, não posso negar. – Lembrava-se do que havia pedido á seus amigos.
- Vamos ser muito felizes juntos.
- Vamos sim. – Falou preocupado, com Patrícia em seus braços.
- Devemos ir agora. O toque de recolher será daqui a quinze minutos.
- Vamos.

Colocaram suas roupas e saíram. A casa do diretor era próxima à escola, a poucas quadras dali. Carregavam em suas costas suas mochilas e o sentimento de mudança do mundo. Ao se aproximarem da casa, tocaram a cigarra e o diretor, agora sem seu fardamento escolar, abriu.

- Ainda bem que chegaram! É quase o toque de recolher! – Disse com gestos mandando os dois entrarem.
- Desculpe pela demora. Estávamos...Conversando sobre amanhã. – O diretor entendeu o que Lucas quis dizer, mas manteve-se calado.
- Espero não incomodar seu espaço senhor. Vamos ser os mais discretos possíveis, nem notará nossa presença! – Disse Patrícia ao entrar.
- Mas é claro que não! Há cinco anos que não há jovens nesta casa, eu sou um velho de 60 anos, as suas presenças aqui me enchem de alegria, mesmo que seja por motivos tão tristes e por tão pouco tempo.
- Obrigada. – Disse meigamente Patrícia.
- Bem, eu separei um quarto só para vocês dois. Claro que querem ficar sozinhos e então deixei tudo organizado. Tem água quente no banheiro, toalhas, sabonetes. E estou preparando um jantar bem reforçado. Tomem banho e venham comer.

Lucas e Patrícia entraram no quarto e colocaram suas malas no chão. Logo entraram no banho. A água estava quente, e os dois estavam dentro do box tomando banho.

- Patrícia, eu quero que saiba que... Seja lá o que aconteça amanhã, eu não vou desistir!
- Eu sei que não vai.
- Temos que fazer nosso dever. Temos que mostrar a esse país a ditadura em que vivemos. – Falou chorando.
- Eu sei. – As palavras saiam engasgadas, e o choro já corria seu rosto.
- O bem estar das pessoas vale mais que qualquer coisa no mundo. – Tudo saia com dificuldade, e a garganta já não permitia falar.
- É... – Já chorava sem agüentar.
- Tudo vai dar certo.
- Vai sim.
- Eu vou te proteger...- A abraçava com ternura, e não permitia que visse seu choro.
- Eu sei que vai...- Patrícia afogada seu rosto em seu peito e também escondia o choro.
- Tudo vai mudar...
- Vai...
- Eu não quero te perder...
- Não vai.

E permaneceram calados por muitos minutos. Saíram do banho, trocaram de roupa e foram até o jantar. Havia naquela sala um ar de calma, típico de uma casa que teve muito amor. O diretor tinha em seus lábios um sorriso que poucos haviam visto. Preparava a comida com carinho e tinha em um dos seus ombros o pano de prato para enxugar as mãos. Perto dali, havia um rádio que tocava música antiga. Ele dançava e cozinhava, como se não houvesse marcado para o dia seguinte um protesto que poderia mudar tudo. Lucas e Patrícia pararam para ver o velho dançando e cantando ao mesmo tempo. Há muito não viam alguém alegre em simplesmente estar cozinhando. Para falar a verdade, em 60 anos de ditadura, tudo deveria ser feito o mais econômico possível. Não havia mais restaurantes que conseguiam sustentar sua empresa por muito tempo e a falta de comida também assolava o país.

- Ora ora, estão me espionando os dois? – Perguntou o diretor quando percebeu que estava sendo observado.
- É que, há muito tempo não via algo assim. – Falou Patrícia que vestia um blusão até os joelhos.
- Minha cara, isso é o que ainda faz de nós humanos!
Patrícia respondeu com um sorriso e olhou para Lucas com amor.
- Ah claro, isso também. – Falou o diretor apontando para os dois. – Mas, venham comer. A comida irá esfriar!
- Parece gostoso. – Exclamou Lucas.
- Aprendi esta receita com a minha mulher, ela cozinhava divinamente!
- Sinto muito pelo o que aconteceu com ela. – Lucas falou sinceramente.
- Sim. Não aceito até hoje. Ela saiu para comprar um pouco de pão para comemorarmos 30 anos de casados, e nunca mais voltou. Fiquei sabendo pela rádio que estavam fazendo uma ronda como esta que houve. Sai louco pela rua para procura-la, mas não a encontrei.
- Temos sorte de estarmos vivos Lucas.
- Eu sei.
- Você tem sorte garoto. Se você fosse filho de um pé rapado como eu, estaria morto no primeiro instante em que soubesse o que você era.

Conversaram por muito tempo. Quando o toque de recolher chegou, decidiram ir dormir para não causar suspeitas. O diretor foi até seu quarto que ficava no fim do corredor principal da casa. Lucas e Patrícia foram até o quarto que ele havia separado para os dois. Repararam que aquele deveria ter sido o quarto do casal. Pois havia ali a cama de casal que aparentava ser usada.

- Venha cá. – Lucas puxou-a para si na cama, ela pôs sua cabeça em seu peito. – Me dá um beijo. – Ela assim o fez. – Amanhã vamos para o protesto disfarçados. Você, eu e os meus amigos do colégio vamos estar lá.
- Está bem.
- Patrícia, se qualquer coisa der errado, quero que corra. Por favor, corra.
- Só vou com você.
- Não! Quero que corra na primeira oportunidade que tiver. Se você for pega outra vez, meu pai não vai deixar você sair nunca mais da cadeia.
- Lucas, eu só vou com você!
- Patrícia, eu não vou me perdoar se você for pega. Não vou!
- Mas eu não posso te deixar sozinho!
- Meu amor, você ainda não entendeu que eu quero um filho seu?
- O que?
- Eu quero um filho seu.
- Por que isso agora? – Patrícia estava assustada.
- Por que eu quero que algo meu viva depois dessa ditadura, e eu quero que seja seu.
- Não temos tempo para filhos Lucas. Vamos viver fugindo...
- Não. Iremos à Venezuela depois de amanhã. Só quero que se algo me aconteça, não hesite em ir.
- Eu não vou.
- Patrícia me escute... – Agora de frente um para o outro na cama. – Existe uma casa em Caracas que está abrigando os refugiados da guerra. Se algo me acontecer, meu pai irá me tirar do quartel, ou meus amigos irão me ajudar a sair. Eu te mandarei cartas enquanto isso.
- Eu não posso fazer isso... – Já caiam as primeiras lágrimas.
- Vamos, não seja teimosa... – Lucas percebera as lágrimas. – Não chore. Tudo dará certo!
- Espero.

No dia seguinte, tudo parecia normal como antes. Mas para aqueles que tinham um sentido aguçado sabia que algo iria acontecer. A cidade aparentava estar calma, mais calma que o normal. Havia, nas ruas, mais soldados que o de costume. O comércio não abrira e as casas permaneciam em silencio. Lucas, Patrícia e o Diretor se levantaram às dez horas da manhã. Patrícia usava uma roupa rippie, diferente do seu modo de ser. Lucas, ao contrário, vestia roupa social. O diretor vestira-se como quem iria trabalhar no sábado.
Lucas passou o dia refletindo sobre como salvar Patrícia em caso de uma emboscada. Sentou-se em frente à janela e observava o movimento alheio. Patrícia percebera a agitação de Lucas, mas resolveu fazer nada porque sabia no que ele estava pensando.

- Quer chocolate quente? – Perguntou meigamente, estendendo a caneca com chocolate fervendo para Lucas.
- Não, obrigado meu amor. Estou sem fome. – O semblante no rosto de Patrícia estava apagado, sentia-se estranha por não conseguir dizer nada.

Enfim eram cinco da tarde e eles haviam saído da casa. O diretor pela porta da frente e o casal pelos fundos. Todos se encontraram na frente da Casa de Praia. Havia nela o grupo de jovens que eram amigos de Lucas, alguns outros mais velhos, universitários. Havia também alguns adultos que não pareciam ser dominados pela imprensa.

- Somos apenas nós? – Perguntou Jorge.
- Neste ponto sim. – Respondeu um dos homens velhos.
- Há outros? – Perguntou o Diretor.
- Espero que sim. Todos os núcleos estão sabendo.
- Faltam menos de trinta minutos. Carlos, como anda a imprensa? – Perguntou Lucas a um dos amigos que estava perto da porta, vigiando.
- Está bem atrás de você. – Lucas virou-se. Estava ali uma mulher com um homem e uma câmera. Prontos para qualquer lance.
- Sabem como irão passar pela imprensa local para divulgar isso?
- Sim, cada um de nós irá ter um microfone na roupa, esse microfone está levando tudo o que vocês falam a um amigo nosso que está na central neste exato momento. Vamos pegar eles hoje, e mostrar a essa sociedade que esse governo não é o que diz que é. – Falou a repórter.
- Não se esqueçam que o nosso protesto é pacífico. Estamos aqui apenas para mostrar ao mundo no que vivemos, nada mais. – Disse Carlos. – Apenas ganhamos prestígio porque nunca matamos ninguém!
- Todos já têm seus grupos? – Perguntou Patrícia. Acenaram com as cabeças.
- Os panfletos? Estão todos aí? – Perguntou Jorge.
- Sim, está tudo aqui, cada um pegue um pouco e coloque nas casas. – Falou um dos velhos.
- Vamos lá. – Jorge disse.

O grupo tinha cerca de 25 pessoas, dentre jovens colegiais, universitários, jornalistas e adultos. Dessas pessoas, foram feitos cinco grupos. Lucas, Patrícia, O Diretor, Jorge e Carlos formavam um deles. Cada um com cerca de 200 panfletos:
“Vamos voltar a ser uma nação, vamos fazer uma união. Queremos Caxias no chão!”
Todas as casas da cidade agora tinham um panfleto desses em suas portas. O movimento silencioso e disperso dos grupos não alarmava qualquer reação da polícia. Que olhava estranho às pessoas. Mas achavam que eram carteiros ou apenas caminhavam nas ruas. Conforme as horas iam passando, mais se aproximavam do Ministério da Justiça: Ponto final do protesto. A cada passo, mais e mais pessoas se juntavam ao grupo. Pessoas estranhas que nunca deram as caras agora estavam caminhando nas ruas com panfletos. Quantos poderiam ser?
A menos de 50 metros das portas do Ministério, a multidão de pessoas somava mais de 5.000. Um dos homens velhos ordenou a todos para que parassem e fizessem um escudo de mais de cem metros de comprimento. Oposto ao escudo havia os policiais. Que usavam armas e capacetes, prontos para uma guerra. Todos os protestantes deram uma as mãos e caminhavam com o mesmo passo em direção à barreira imposta. Um passo dado, barreira recua um. Mas, percebendo da valentia dos jovens, a polícia impõe sua força e arma-se. Colocam em seus ombros as armas e aponta para o “front” dos jovens. O velho ordena que parem. A central da impressa escuta tudo o que está acontecendo e transmite direto para a rádio local. Tudo estava sendo escutado pelo país inteiro. Disso os militantes não sabiam. Mais um passo. A polícia prepara-se para a luta. E então Lucas sai na frente. Carrega em seu peito um livro. Enquanto a multidão de homens atrás dele continua firme e quieta. Mais um passo, outro. A polícia não sabe o que fazer. Lucas aproxima-se daquele que parece ser o Comandante, estica-lhe o braço e impõe o livro.

- Aquilo do que se esqueceram. – E mostrou o livro.

O Comandante abriu o livro e nele estava escrito “Declaração Universal dos Direitos Humanos” No exato momento em que Lucas virou-se, um tiro acerta-o nas costas e cai no chão sem interrupções.

- Não! – Patrícia não consegue permanecer no local onde está, sai correndo dentre a multidão em direção a Lucas. Mas seus amigos a impedem. Agarram-na pelos braços e ela debate-se entre a multidão. – Tenho de salva-lo! – Gritava e chorava compulsivamente. A multidão fez um circulo em volta de Lucas e olhava perplexa ele caído no chão.
- Seu covarde! – Gritou um dos velhos para o policial.
- Saiam daqui. – Disse o comandante. Patrícia ainda tentava livrar-se das mãos dos amigos.
- Foda-se. – Falou um dos amigos.

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