Codinome Orquídea - Parte 7

domingo, 8 de junho de 2008


Lucas foi arrastado para fora da multidão por um alguém que Patrícia não conseguira ver. Jorge e Carlos a puxavam para fora da multidão e da briga que agora acontecia. Os policiais atiravam nas pessoas e estas apedrejavam e corriam para salvar suas próprias vidas.
Na rádio, só se escutavam pessoas implorando, morrendo, tiros e ordens policiais para que matassem principalmente os jovens. As famílias escutavam perplexas nas suas casas tudo o que acontecia e outros corriam para fora de casa.
Jorge e Carlos conseguiram tirar Patrícia em meio da multidão. Ela chorava sem conseguir parar e se rendia ao cansaço e a força dos meninos.

- Patrícia, Lucas nos pediu para que qualquer coisa que acontecesse com ele você deveria ser tirada do país imediatamente. – Jorge tentava acalmar o coração partido de Patrícia. Estavam os três sentados no chão de um bar que tentava fechar as portas.
- Senhor, por favor, nos ajude. Pode nos esconder até o protesto acabar? – Pediu Carlos àquele que parecia ser o dono do bar e havia conseguido fechar suas portas com eles dentro.
- Claro. Acabei de escutar tudo pela rádio, que absurdo! Mataram aquele pobre garoto! Eu o conhecia! – Patrícia soltou outro choro desesperado.
- Eu tenho de ir salva-lo. – Gaguejava.- Não posso deixa-lo lá.
- Patrícia, tudo o que você pode fazer é sair desse país.
- Ele não pode ter morrido... Não pode, ele queria ter um filho! Um filho!
- Eu sinto muito. – Jorge a abraçou.
- Descanse. Há muito que fazer amanhã, vamos precisar sair cedo. – Alertou Jorge, que tentava olhar entre as brechas da porta do bar o que acontecia.

E ali ficaram por muitas horas. Patrícia não conseguira dormir. Escutava do lado de fora pessoas serem presas, tiros, mortes. Mulheres que gritavam, lutas, sangue. As pessoas se trancavam nas suas casas. Mas a polícia invadia todas elas, e não sabia como não haviam invadido também o bar onde estavam. Às duas da manhã, ela decidiu levantar-se e sair do bar. Jorge e Carlos haviam adormecido, provavelmente haviam ficado acordados para vigia-la e não deixar que escapasse. Mas não poderia continuar ali, e muito menos ir para a Venezuela sem saber o que havia acontecido com Lucas. Saiu na calada da noite por uma porta que estava apenas no ferrolho e deixou os dois companheiros para trás. As ruas estavam desertas, o comércio havia sido saqueado e ainda havia pessoas caídas no chão. Uns vivos, outros mortos. Mas o Ministério estava intacto. Ninguém conseguiu chegar perto dele, e ainda havia militantes ao seu redor. Passou por entre as sombras e caminhou lentamente pelas ruas para que não fosse vista. Para onde iria? Se fosse até o quartel, provavelmente a prenderiam e não veria Lucas de qualquer maneira. Estaria ele no hospital? Não. Também deveria ser presa. Os hospitais, desde o começo da ditadura, eram vigiados. Onde estaria então? Sabia que alguém tinha o pego quando começou a luta, mas quem?

- Será que ele conseguiu? – Perguntou de frente à porta da casa do Diretor.

Tocou a cigarra duas ou três vezes. Resolveu então olhar toda a casa do lado de fora e ver se havia alguém dentro. Percebeu, quando chegou na janela da cozinha uma chaleira que tinha água fervendo. Olhou em volta mais não havia ninguém. Viu, de repente, um vulto passar pelo corredor. Havia alguém. Amigo ou inimigo? Pensou.

- Patrícia! – Exclamou o Diretor quando a viu do lado de fora da casa.
- Ah Graças a Deus tem alguém! – Sentiu-se muito feliz em vê-lo.
- Venha, entre, deve estar com frio e fome.
- E Lucas? – Estava aflita.
- Venha, ele está aqui dentro. – Falou triste.

Caminharam até dentro da casa e logo depois até o quarto onde Patrícia e Lucas haviam dormido. E lá estava ele, inconsciente, sobre a cama. O Diretor havia tirado sua roupa e feito chá para ele.

- Como ele está? – Patrícia aproximou-se do corpo de Lucas com carinho e sentou-se a seu lado.
- Está assim desde que levou o tiro. Não podemos leva-lo para o hospital, está sendo vigiado.
- O que faremos então?
- Não sei. Não sei como extrair a bala das costas, acho que não pegou em nenhum lugar importante. Só está perdendo muito sangue.
- Traga mais pano. Vou limpa-lo.
- Está certo. – E saiu do aposento.
- Lucas...Como achou que eu iria mesmo á Venezuela? – Acariciava-o. – Seu bobo. Só faz loucura.
- Aqui está. – Chegou o Diretor cheio de panos.
- A mãe de Lucas é enfermeira. Mas não sei como contata-la sem que o seu marido saiba.
- Eu posso ir lá.
- Faria isso por mim? – Suplicava com os olhos.
- Já estou indo. Espero que tenhamos sorte.

Patrícia tirou o lençol que cobria Lucas. Mesmo fazendo frio aquela noite, precisava limpar todo o seu corpo. Limpava o sangue que ainda escorria e o esquentava com seu corpo. Trancou todas as janelas e colocava velas no quarto para que este ficasse mais quente. Colocou panos quentes sobre seu corpo e o acariciava vez ou outra.

- Meu filho! – A mãe de Lucas havia chegado.
- Que bom que a senhora veio, muito obrigada! – Exclamou Patrícia ao vê-la.
- É meu filho! Como não viria?
- Ele levou um tiro nas costas, está sangrando muito.
- Vocês foram ao protesto?
- Não soube? – Espantou-se.
- Meu marido tirou todas as rádios de casa.

Silêncio. A mãe pediu para que virasse Lucas de costas para que visse o ferimento. Esterilizou alguns objetos hospitalares que tinha e tentava tirar a bala cravada em suas costas. Por fim tirou.

- É uma bala de borracha. Não entrou muito na carne.
- Graças a Deus!
- Patrícia, eu sei o quanto meu filho te ama. Por favor, cuide bem dele.
- Já vai?
- Sim, meu marido irá perceber minha falta, tenho de ir. – Beijou o filho na testa e saiu.
- Será que ele vai ficar inconsciente por muito tempo? – Perguntou Patrícia ao Diretor.
- Não faço a menor idéia.

E ficou. Por horas e horas. Já era domingo pela manhã e Lucas dormia, desta vez com um semblante sereno. Patrícia adormeceu ao seu lado, numa cadeira. O sol já raiava e já era outro dia quente. Parecia que nada havia acontecido.

- Acorde Patrícia. Venha comer um pouco, está sem comer nada desde ontem. – Falou o Diretor abrindo a porta em de leve.
- Que horas são?! – Patrícia levantou assustada.
- São dez da manhã.
- Ah que droga! Perdemos o caminhão de soja... – Triste.
- Não poderiam ir de qualquer forma. Lucas está inconsciente até agora, como iria leva-lo?
- Os seus amigos iriam ajudar. Mas que droga...
- Tudo bem. Podem ficar aqui o quanto quiser.
- Estamos pondo em risco a sua vida. Não posso permitir isso.
- Ora minha cara...Sou um velho de 60 anos, pondo risco em minha vida? Ela já acabou faz muito tempo. Anda, vem comer. Ele vai ficar bem. – Patrícia olhou para Lucas que ainda dormia.
- O que temos para comer hoje? Está fazendo um cheiro bom...Parece...Café! – Nasceu um sorriso em seu rosto.
- É. Tenho um pouco que veio da fronteira.

O Diretor e Patrícia foram até à sala para tomarem seu café da manhã. Estavam calados enquanto comiam. Patrícia refletia sobre o que fazer em seguida. Certamente o pai de Lucas estava procurando por ele e por ela também, e não ia ser tolerante com nenhum dos dois quando soubesse que eles tinham participado do protesto do dia anterior.

- Patrícia... – Lucas soltou um grunhido do quarto. Patrícia correu para vê-lo.
- Está acordado! – Um sorriso saltou-lhe dos dois cantos da boca.
- A que maravilha! – Exclamou o diretor. – Vou deixar os dois sozinhos para que conversem, vou preparar algo para ele comer.
- Ai que bom que acordou. – Beijava-o. – Tive tanto medo!
- Eu estou...Bem.
- Graças a Deus... – Continuava a beija-lo. – Você está bem!
- Ai!
- Ah desculpe. Como está se sentindo?
- Só um pouco zonzo. O que houve?
- Uma guerra Lucas, muitos mortos. Muitos presos. Perdemos o caminhão de soja.
- Você deveria ter ido.
- Já disse que não ia sem você.
- Mas que teimosa!
- Não adianta. Eu iria ficar de qualquer forma.
- E os meninos não te levaram?
- Tentaram, mas ficamos escondidos em um bar perto.
- Por que não foi? Estava correndo perigo!
- Já disse que não vou sem você, mas que insistência!
- Tudo bem. Não vamos discutir.
Entra no quarto o Diretor com uma bandeira colorida e cheirosa para Lucas.
- Seu estômago deve estar implorando por isto. – Disse.
- Ah sim. Verdade!

Terminado o lanche, o Diretor decidiu ir ver tevê para saber o que a polícia estava dizendo sobre o acontecimento do dia anterior. Patrícia e Lucas ficaram no quarto conversando sobre o seu futuro e o que deveriam fazer dali em diante.
O protesto causara várias mortes, porém um número insignificante se comparado à quantidade de mortes que já houvera durante toda a Ditadura.
Em 2012, quando a Terceira Guerra mundial acabara, o Brasil ficou devastado pelas bombas e pela disputa comercial que havia em seu território. Havia em cada esquina, um comércio de nacionalidade diferente, e o Brasil era o mercado. A população via-se obrigada a comprar produtos estrangeiros, pois a concorrência com o produto mais barato, fez as empresas nacionais falirem. O presidente tornara-se uma imagem figurativa do governo, agora quem comandava eram as empresas multinacionais que se instalaram no Brasil. Emprego ou desemprego eles que controlavam. Em 2013, um ano após o fim da Terceira Guerra mundial, os ideais de Anarquismo tomaram conta do cenário brasileiro. A presença estrangeira no país fez com que muito daquilo que era brasileiro tornar-se estrangeiro. O Brasil participou da Terceira Guerra ao lado dos Estados Unidos, mas devia mais ainda a este país. Por tanto, a única saída era abrir os portos para as empresas americanas e também européias. Com a economia nacional já quebrada, os burgueses começam a juntar-se ao movimento libertador brasileiro. Em 2015, o partido Anarquista brasileiro já tem mais da metade do congresso nacional. Os estrangeiros, vendo seus interesses econômicos ameaçados, interferem na política brasileira, e então começa uma nova guerra civil. Cinco anos se passaram até que o Anarquismo caísse. A pressão externa fora tão alta que muitos brasileiros se viram obrigados a saírem do país e procurar aqueles que ainda resistiam aos capitalistas. E então surgiu o comunismo novamente, calado e discreto. Temendo a tomada de poder, o Brasil sofre um golpe de estado em 2025, e perpetua a Ditadura até os dias atuais.

- Em nota, o governo afirma que recebeu denúncias de bombas e fabricação de vírus pelos Comunistas. – Falava a repórter na televisão. – O senhor tem algo a declarar Comandante? – Perguntou a um militar que estava ao seu lado na tela.
- Soubemos da denúncia pouco antes dos anarquistas chegarem. A nossa decisão foi esperar para ver. E então aquele rapaz nos entrega um livro, que as análises mostraram que continha um pó letal em suas páginas. O militar que o recebeu morreu poucas horas depois. Uma ameaça à população. – Falou secamente.
- Ah eu não acredito nisso! Que loucos! – Exclamou o Diretor na sala. Patrícia saiu do quarto para ver o que se passava.
- O que houve?
- Agora vocês são produtores de vírus!
- Como é que é?
- Não sei como conseguiram, mas eles voltaram a ser os mocinhos da história.
- Que droga!
- Mas não se preocupe, que depois do que houve ontem, muita gente está com o pé atrás com a polícia. Hoje foram presos mais 20, acredita?
- Estamos perdidos.
- Temos que sair do país Patrícia. – Lucas se apoiava na beirada da porta, ainda com dores.
- Lucas! Não pode se levantar, ainda está sangrado! – Patrícia correu para coloca-lo entre seus braços. – Você me dá trabalho!
- Não agüento mais ficar nessa cama, preciso fazer algo.
- Venha, deite-se. – O colocou na cama. – Não faça mais isso! Ainda está muito cedo para se levantar. Mesmo que o tiro tenha sido de borracha, você sangrou muito.
- O que vamos fazer Patrícia?
- Eu não sei.
- Temos que fugir do país.
- Como?
- Não sei.

1 comentários:

Cássio disse...

Tá bombando essas Orquídeas hein?!
Tu deverias divulgar esse blog!
http://oediporei.zip.net/
beijos.